A Ford, uma das fábricas mais tradicionais do ABC paulista, e conhecida pela conquista da primeira Comissão de Fábrica e por greves heroicas dos anos 80 e 90, que duravam vários dias, encerrou suas atividades no dia 30 de outubro de 2019, demitindo mais de 3 mil trabalhadores.
O acontecimento é parte do processo profundo de desindustrialização no Brasil e do ABC paulista em particular, que já foi uma das regiões mais industrializadas do país, com uma classe operária das mais combativas e palco de greves e lutas importantes, como a dos fins dos anos 70, fundamental para a derrubada da ditadura militar no país.
O fechamento da fábrica, além de ser um símbolo da política da burguesia brasileira para o país como um todo com o avanço do processo de desindustrialização e a priorização da produção de produtos primários e agropecuários voltados para a exportação, mantendo a posição do Brasil como um país de economia dependente e subordinada aos interesses imperialistas.
Também é uma amostra da reestruturação das indústrias do setor automobilístico pelo mundo, com milhares de demissões, transferência das plantas produtivas para regiões com força de trabalho mais barata e, sobretudo buscando incentivos fiscais em outras regiões. Tudo para garantir suas taxas de lucro.
Sindicato – filiado e fundador da CUT – aceita o fechamento da fábrica
Mesmo com o processo de desindustrialização, a reestruturação mundial do setor automobilístico e a crise econômica no Brasil, não é a classe trabalhadora que deve suportar as consequências.
Que os governos e os patrões tentam impor essas consequências já é de se esperar, mas o sindicato dos Metalúrgicos do ABC aceitou essa condição e entregou sem nenhuma resistência o emprego dos trabalhadores da FORD, aceitando o fechamento que vai ter consequências econômicas para toda região, afetando também milhares de outros trabalhadores que fazem parte da cadeia produtiva da Ford.
Desde o início do processo, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, teve uma atitude de negociação com os patrões enquanto dizia aos empregados da empresa que ficassem em casa.
O máximo que a direção do sindicato impulsionou foi uma passeata rumo ao centro de São Bernardo, sem nenhum tipo de ação direta. Nas primeiras assembleias, os dirigentes do sindicato mencionaram várias vezes, que estariam dispostos a fazer qualquer coisa para negociar com a empresa (leia-se, redução de direitos). O sindicato chegou a se reunir com direção da Ford nos Estados Unidos, onde ouviu um sonoro “NÃO”.
Também apostaram que outra empresa comprasse e para isso até se comprometiam a não fazer reivindicações “exageradas”. Objetivamente não houve resistência, pelo contrário.
Seria possível uma alternativa?
A atitude da Ford não era um blefe para negociar perda de direitos, mas realmente a demissão de milhares de trabalhadores. A lógica das empresas é o lucro, mesmo que custe o emprego de milhares de pessoas.
O problema é que as principais direções sindicais do país, no lugar de organizar a resistência a esses ataques, se aliam aos patrões. É bem o caso do fechamento da FORD em São Bernardo do Campo.
Ao não resistir ao fechamento e tratar a questão como “um problema dos metalúrgicos da FORD” o resultado foi a imposição da vontade da empresa e a demissão dos trabalhadores.
O sindicato não realizou nenhuma campanha de solidariedade, não chamou para a luta e nem outra forma para envolver a população da região em defesa do emprego dos operários da Ford.
A resistência a única possibilidade de reverter essa situação. Os operários já não tinham mais nada a perder, pois já não contavam mais com o emprego. A única possibilidade de resistir ao fechamento da fábrica era o sindicato orientar a ocupação da fábrica pelos trabalhadores, possibilitando ampliar a luta e realizar uma campanha que extrapolasse os muros da fábrica e criasse uma corrente de solidariedade junto a população.
Temos consciência que ocupação de fábrica não é uma luta simples e deve ser uma ação muito bem pensada e organizada, pois sabemos que os aparatos repressivos agiriam logo e sem piedade para defender a propriedade privada.
Mas, era a única forma de garantir os empregos. Sem radicalização a patronal não recua.
Por que o Sindicato/CUT não reagiu?
Como já foi dito acima, desde o início não foi organizada nenhum tipo de luta direta.
Mesmo no momento derradeiro da luta, na última assembleia, em que o sindicato anunciou o fechamento da fábrica, os sindicalistas mandaram todos os trabalhadores para casa e não propuseram nenhum comitê, atividade, reunião aberta e muito menos, obviamente, a ocupação. Se limitaram a dizer o óbvio: era um dia triste e tinham até chorado na mesa de negociação.
O que parece ser um erro tático é, na verdade, muito bem pensado. O comprometimento da CUT, da Força Sindical, CTB e demais centrais e sindicatos vendidos é manter o sistema dominante de exploração, onde têm os seus privilégios e, para isso, podem entregar sem luta fábricas inteiras e o emprego de milhares de trabalhadores. Não vão chamar nenhuma luta que não possam controlar.
Uma parte importante da classe trabalhadora já percebeu o papel cumprido por essas direções. Por isso, muitos processos de luta que observamos na América Latina e no mundo acontecem à revelia e apesar das direções tradicionais do movimento.
E a classe trabalhadora está certa: Não podemos ter o mínimo de confiança nos mesmos que entregaram o emprego de milhares de trabalhadores. À luta!