Há mais de 37 anos, desde o final da Ditadura Militar, uma das políticas da classe dominante brasileira tem sido fortalecer a democracia liberal. Essa também chamada democracia burguesa e todos os governos que vieram após seu advento fizeram com que a burguesia brasileira conseguisse manter a subserviência econômica e política ao capital financeiro norte-americano e europeu; impor a privatização de setores chaves da economia; ataques e retiradas de direitos de trabalhadores e população carente.
Para seguir, a democracia burguesa busca cooptar lideranças e organizações da classe trabalhadora e dos movimentos sociais integrando-os ao regime com cargos no Poder Executivo e Legislativo. Ao mesmo tempo, mantém essa democracia de fachada, um auxílio Judiciário, restringe cada vez mais as poucas liberdades democráticas (duramente conquistadas com derramamento de sangue e com a vida de brasileiros na luta contra a Ditadura Militar), reforça leis antimovimentos sociais e aumenta todo o aparato repressivo contra os trabalhadores.
Mesmo tendo esse cenário como pano de fundo, Bolsonaro e os setores sociais que o apoiam procuraram demonstrar força, até com ameaças golpistas, no 07 de setembro. Não tomaram como exemplo a fracassada tentativa, meses antes, do mentor Donald Trump contra o Congresso norte-americano. O que esperavam esses setores da burguesia (agronegócio, parte do chamado Mercado da Fé, Havan, Grupo Madero, Federação das Indústrias de Minas Gerais, etc); de pequenos burgueses como micro e médios comerciantes; pequena parcela de caminhoneiros a mando de algumas empresas do setor; setores do aparato repressivo como policiais e militares; segmentos organizados do lúmpen proletariado como milicianos, etc.?
Com bravatas Bolsonaro e seu grupo aprofundam a crise econômica e ataques aos trabalhadores
Sem negar a personalidade fascista de Jair Bolsonaro, não é de hoje que se utiliza dos chamados factoides para desviar o foco de ações. Tivemos, recentemente, a sua defesa de voto impresso nas próximas eleições. E ao mesmo tempo procurava desviar a atenção sobre a denúncia, na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), de corrupção governamental na compra da vacina indiana Covaxin contra COVID-19. Agilizando também a votação da privatização da Eletrobrás e do projeto de entrega de Correios.
Depois da derrota do voto impresso, Bolsonaro voltou a mobilizar suas bases para não ser enquadrado pelas decisões do Judiciário e sua máxima corte, o STF. E teve como alvos de seus ataques os ministros Alexandre de Moraes e Luís Eduardo Barroso.
Não por coincidência, ao mesmo tempo em que o dito ex-capitão convocava manifestações em apoio ao seu governo, a inflação chegava ao patamar mais alto desde 2015; o litro da gasolina atingia R$ 7,00 e fazia subir preços de produtos essenciais à cesta básica como feijão; aumentava o desemprego (até para muitos precarizados motoristas de UBER); o real mais desvalorizado em relação ao dólar; a Reforma Administrativa segue avançando e não somente ameaça os servidores públicos, atinge principalmente a população pobre que utiliza serviços como Saúde e Educação. E foi feita mais uma de corrupção do clã Bolsonaro, envolvendo ex-esposa e o filho mais novo Jair Renan.
Toda essa política desenvolvida por Bolsonaro e seu grupo, de convocação de atos e possibilidade de greve nacional de caminhoneiros que paralisasse as rodovias do país, gerou uma divisão interburguesa. No entanto, não é em relação à pauta econômica que vem sendo tocada pelo governo no Congresso Nacional, mas somente em relação à realização de atos de caráter golpista.
O setor burguês majoritário contrário aos atos e em “defesa das instituições e da democracia” tem o principal sindicato patronal do país a FEBRABAN (Federação Brasileira dos Bancos) e a maioria dos chamados “barões” da grande imprensa. Com o Bolsonaro ficaram setores minoritários citados acima. Já a Federação das Indústrias de São Paulo (FIESP) ficou “em cima do muro”, assim como um setor expressivo do Mercado da Fé.
Atos de Bolsonaro: expressivos, sem atingir o prometido
Nos preparativos dos atos em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro enquanto a trupe governamental convocava ao melhor estilo fascista de mobilização de amplas massas, o STF enquadrava o cantor fazendeiro Sérgio Reis, que estava à frente. Nas vésperas, o ministro Alexandre de Moraes mandou prender o suposto líder dos caminhoneiros, Zé Trovão. O resultado dessa queda de braços entre poderes acabou gerando atos abaixo dos 2milhões de participantes e sem a concretização da implantação de golpe do “estado de sítio”, prometidos aos seguidores do governo.
Um menor número de presentes, do que imaginava o governo, mostrou o desgaste na popularidade de Bolsonaro em queda acentuada depois da COVID-19 e da ausência de uma política de combate; da crise econômica; do aumento do desemprego, etc. Ainda assim, os atos expressaram 20 a 25% dos que o seguem apoiando. No ato, Bolsonaro chamou Alexandre de Moraes de “canalha” e disse que não mais se submeteria a qualquer decisão do Judiciário.
A reação do “mercado” foi imediata, como esperado: não respaldou o discurso de Bolsonaro. As Bolsas caíram e o dólar novamente disparou. Respaldado pela grande mídia o STF, como porta-voz do “mercado” e do sistema financeiro, defendeu novamente “as instituições e a democracia”. O Congresso Federal dirigido pelo “Centrão”, produto de acordos costurados por Bolsonaro para garantir sua governabilidade, de maneira tímida foi no mesmo sentido do Judiciário.
Bolsonaro teve que recuar: desmontou a greve de caminhoneiros, que começava a se ensaiar e parar o trânsito em algumas rodovias. Além disso, procurou o ex-presidente “tampão” Michel Temer para costurar uma reaproximação com o Judiciário, através de uma carta ao STF, respaldada pelos líderes governamentais.
Após a carta, o PSDB como partido mais representativo da grande burguesia recuou da ideia de entrar com mais um pedido de impeachment. E o presidente da Câmara, Arthur Lira, se sentiu tranquilo para continuar sentado em mais de uma centena de pedidos. Isso tudo até a próxima bravata.
Enquanto toda essa pirotecnia, ameaças de “golpes” e de rupturas institucionais ocorrem, a inflação e o desemprego seguem em alta, a Reforma Administrativa avança e impõem os processos de privatização da Eletrobrás e de Correios.
Grito dos Excluídos: atos significativos, menores do que os da turma do Bolsonaro
No mesmo dia em dezenas de cidades foram realizados atos pelos movimentos sociais. Afinal, desde 1995 é realizado o “Grito dos Excluídos” no dia da “Independência” e, sem sombra de dúvidas, esses foram os maiores atos desde então. Entretanto, esses atos poderiam ter sido maiores se as direções majoritárias tivessem colocado força na convocação. Ao contrário, o que se observou foi o medo de mobilizar para as ruas e para o enfrentamento, com o pretexto de “golpe”. Essa postura lamentável abrangeu dirigentes petistas e também o ex-deputado do PSOL, agora no PSB, Marcelo Freixo.
Na verdade, essas direções, distantes das ruas, apostam tudo também no respeito às instituições e à democracia burguesa, mesmo quando ferram trabalhadores e explorados. E é dessa forma que petistas, cutistas, PCdoB, UNE e MST acreditam que assegurarão a volta de Lula nas eleições de 2022. Já Marcelo Freixo, se mostrando obediente e servil às instituições, busca encabeçar e construir a Frente Ampla até com o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, que dias atrás aumentou a contribuição previdenciária dos trabalhadores municipais.
Entendemos que o caminho é justamente o inverso. Diferente dos que defendem “o Estado Democrático e de Direito”, defendemos as liberdades democráticas no sentido de garantir a ampla participação dos movimentos sociais. Portanto, entendemos que não é nos retirando das ruas, que vamos garantir a defesa de liberdades democráticas, muito pelo contrário.
Observando esse comportamento da direção majoritária dos movimentos sociais podemos entender o porquê não se avança na construção de uma Greve Geral pelo FORA BOLSONARO, todo o seu governo e contra a retirada de direitos. Ou não se avança na construção de uma Greve Geral de Todo o Funcionalismo (federal, estadual e municipal) contra a Reforma Administrativa e em unidade com trabalhadores/as de estatais contra as privatizações (como Eletrobrás, Correios, Petrobrás, etc.). É deixar o atual governo fazer o trabalho “sujo” exigido pela burguesia e seguir com os projetos eleitorais e de possíveis governabilidades. Enfim, quem sai perdendo, mais uma vez, é a classe trabalhadora de conjunto sem uma Greve Geral em plena intensificação da pandemia, da exploração e da repressão.
Por fim, o fracasso dos atos de 12 de setembro, dirigidos por arautos da 3ª via (MBL, PDT e Ciro Gomes, PSDB e outros partidos burgueses), reforça a necessidade da pauta de trabalhadores/as, que não pode estar subordinada a essa pauta de eleições/2022. A nossa pauta deve construir a luta para anulação das Reformas Previdenciárias (1998, 2003 e 2019); a reestatização de todas as empresas que foram privatizadas, Petrobrás 100% estatal; contra a privatização da Eletrobrás, Correios, NUCLEP, etc., contra a Reforma Administrativa; plano de obras públicas para geração de empregos; salário mínimo calculado pelo DIEESE; estatização de todo o sistema financeiro e não pagamento da dívida externa. Lutemos por essa pauta, pelo FORA BOLSONARO e todo o seu governo com a necessária e imediata preparação da Greve Geral. Somente em unidade de ação a classe trabalhadora e o conjunto de explorados/as poderão manter liberdades democráticas e impedir retiradas de direitos!