A derrota recente no Plebiscito (que ia referendar uma Nova Constituição para o Chile e também enterrar a Carta Constitucional, em vigor desde 1980, após o golpe encabeçado pelo general Augusto Pinochet em 11 de setembro de 1973 contra o presidente Salvador Allende e passando até por governos como o da “socialista” Michele Bachelet) mostrou os limites da condução política dada ao processo de explosão popular que passou o país andino, em 2019 e 2020.
Em dia 25 de outubro de 2019, protestos estudantis começaram contra o aumento das passagens no Metrô e culminaram com a maior manifestação da história chilena (com 1,2 milhão de pessoas). Precedida de uma Greve Geral que, enfrentando o Estado de Emergência decretado pelo presidente ultraliberal Sebastião Piñera e a violenta repressão de Carabineiros (polícia com histórico criminoso desde o governo Pinochet), resultou em 20 mortos, 592 civis feridos e centenas de detidos infelizmente.
Todo esse processo foi canalizado para o fortalecimento das instituições da democracia burguesa e não buscou a superação das mesmas. Nesse sentido, em abril de 2020, foi eleita uma Convenção Constitucional para uma nova Constituição, em que 80% dos votantes se mostraram favoráveis a uma nova Carta. Ao mesmo tempo abriu-se mão, na prática, da construção de uma nova Greve Geral, que faria com que a classe trabalhadora e a população explorada não perdessem as rédeas da condução política no país. Dessa forma, garantiu-se a governabilidade de Piñera até o final do mandato.
As eleições presidenciais chilenas, em final de 2021, deram mais um sinal de que “tudo que não avança, retrocede”. O candidato da extrema-direita José Atonio Kast venceu o primeiro turno com 2,08% de vantagem de Gabriel Boric, da Frente Ampla chilena. E somente no segundo turno, em dezembro, Boric venceu a eleição com 11,74% de votos de vantagem.
Porém, com inflação acima de dois dígitos, altos preços do gás e dos alimentos a popularidade de Boric despencou no seu primeiro ano de mandato, não se mostrando diferente do modelo anterior de governo. E mesmo que a nova Carta Constitucional tivesse pontos importantes (como Saúde, Previdência, Educação pública, além de outros setores e enterrasse em parte o entulho constitucional pinochetista) a mesma não mexia na propriedade privada dos meios de produção e não tocava um milímetro nas Forças Armadas, colunas vertebrais do Estado burguês chileno e bastião do governo genocida de Pinochet.
O resultado foi que por 61,8% a 38,1% o Plebiscito consagrou a vitória do “Rejeito” contra o “Aprovo” e a nova Carta Constitucional chilena foi rechaçada, em início de setembro de 2022. O governo Boric, em seguida, anunciou uma Reforma Ministerial e prometeu uma nova Carta Constitucional com o Congresso (onde a oposição, reunida em setores de centro-direita, de direita e de extrema direita, tem a maior quantidade de cadeiras).
Enfim, Boric abrirá um novo processo constituinte, totalmente institucionalizado com os partidos políticos e as instituições do Estado. Isto é, deixará de fora quem não têm representação política no Congresso. E jogará a pá de cal no rico processo de explosão social da classe trabalhado por qual passou o Chile em 2019 e 2020.
Argentina: Resposta de massas ao atentado de extrema-direita
Em meio a uma grave crise econômica, em que se projeta uma inflação para 2022 de 95%, o presidente argentino Alberto Fernández viu despencar, em torno de 21%, a sua já frágil popularidade.
Fernández (com a vice peronista Cristina Kirchner), eleito em 2019, com uma expectativa de não se submeter ao capital financeiro como fez o seu antecessor ultraliberal Macri, diante do caos econômico e político que se avizinha no país passou o controle das principais áreas do governo ao atual presidente da Câmara de Deputados Sergio Massa, que possui largos serviços prestados ao capital financeiro, no governo de Macri.
Massa acabou se tornando um “superministro” da Economia, Desenvolvimento Produtivo, Agricultura, Pecuária e Pesca e tem buscado a construção de um novo acordo com o FMI, que promete mais ajustes fiscais e mais ataques sociais. Foi nessa conjuntura, em que as propostas liberais capitalistas tomaram a ofensiva política com a anuência do peronismo, que se deu a tentativa fracassada de atentado a Cristina Kirchner por Fernando Andrés Sabag Montiel (brasileiro simpatizante do bolsonarismo, em uma falha suspeita da segurança peronista.
Como resposta à tentativa de atentado de extrema-direita grandes manifestações convocadas por Fernández ocorreram em Buenos Aires e nas grandes cidades argentinas, em início de setembro. Foram apoiadas na memória histórica construída no país contra o sanguinário regime militar que governou de 1976 a 83 e que terminou com quatro ex-presidentes (Jorge Rafael Videla, Roberto Viola, Leopoldo Galtieri e Reynaldo Bignone) presos por crimes de tortura, sequestro ou assassinato.
Esse rechaço à tentativa de atentado fascista contra Kirchner tem que ser parte de uma justa campanha da esquerda internacional contra a extrema-direita. Uma outra questão, é estarmos atentos porque tanto Fernández quanto Kirchner (antes do atentado com baixa popularidade, em torno de 20%) procuram utilizar o episódio para cacifar novamente o governo, que tem se mostrado submisso ao capital financeiro e ao FMI.