Foram encerrados, depois de 18 dias, os grandes protestos que bloquearam estradas, formaram barricadas e fomentaram a greve geral que paralisou o Equador, em junho último. Com os indígenas à frente e uma importante participação das mulheres equatorianas, que protagonizaram uma histórica marcha em 25 de junho, os grandes protestos tinham como alvo o custo de vida, a pobreza e a alta nos custos de combustíveis.
Os protestos que fizeram o governo decretar o Estado de Exceção e que deixaram seis mortos, 114 policiais feridos, oito desaparecidos e 127 pessoas detidas tinham também como um dos objetivos a destituição do presidente banqueiro Lasso. Entretanto, a bancada parlamentar do Pachakutik, braço político da Confederação de Nacionalidades Indígenas (CONAIE), através de Marlon Santi, coordenador nacional, pediu que os manifestantes “voltassem às zonas de paz”, desmobilizando, dessa forma, o movimento.
O partido do ex-presidente Rafael Correa, a Unión por la Esperanza (UNES) chegou a tentar limitar os protestos e enfrentamentos de rua, canalizando os mesmos para a democracia parlamentar e, assim, no Parlamento votar uma moção para o afastamento de Lasso. Contudo, a posição da bancada parlamentar Pachakutik também foi contra a moção, ou seja, na prática se posicionou pela permanência de Lasso no poder.
Com atuação direta do Papa Francisco e seus pedidos de calma, a Igreja Católica equatoriana, intermediou um acordo envolvendo a CONAIE, presidida por Leonidas Iza e o Governo, representado pelo ministro Francisco Jiménez. Na ata do acordo, houve uma vitória parcial: conseguiu-se uma pequena redução nas tarifas da gasolina comum e do óleo diesel, subsídios para fertilizantes e o perdão de dívidas mediante a liberação pelo FMI de um bilhão de dólares. Esta medida, porém, só joga a crise para frente, pois o FMI seguirá submetendo o povo equatoriano a uma política brutal de austeridade para que ele pague o empréstimo contraído pelo Estado equatoriano.
Não obstante sua importância, a explosão popular que sacudiu o Equador em junho, ela ficou nos mesmos limites dos protestos de 2019, que acabaram desviados para a institucionalidade e permitiram que Lasso chegasse ao poder. Outros paralelos com a recente rebelião popular no Equador podemos observar nos acontecimentos no Chile em 2019/2020 e no Paraguai e na Colômbia, em 2021, ou seja, não rachou a coluna vertebral do Estado burguês equatoriano e nem as forças armadas. Tampouco foram construídos organismos alternativos de poder da classe trabalhadora e da população oprimida e explorada, ainda que muitos militantes da esquerda enxerguem que a CONAIE poderia cumprir esse papel.
Com uma situação objetiva cheia de contradições sociais e disposição de ação por parte do povo equatoriano, ainda não se desenvolveu uma consciência com força para enfrentar a burguesia e os obstáculos que as direções do movimento colocam. Foi notório a ausência de uma direção política que procurasse fazer com que a explosão popular extrapolasse os limites da democracia liberal.
Portanto, essas lacunas foram decisivas para que o movimento de junho último não avançasse para além da ata de acordo. Agora, o banqueiro presidente Lasso partiu para o contra-ataque e tenta criminalizar o movimento social, dizendo que o movimento indígena é financiado pelos traficantes de drogas. É a lei da dialética: tudo que não avança, infelizmente, retrocede.