A tendência é que a guerra entre russos e ucranianos dure muito tempo. Os números já revelam dezenas de milhares de mortos e feridos, apesar das disputas “pela verdade” das cifras. Vários atingidos acabam com graves mutilações ante o pesado arsenal utilizado, tipo “de última geração”, armas de ampla destruição.
Milhares de jovens soldados já estão mortos ou sequelados, cidades destruídas por bombardeios, desconexão sócio econômica geral na Ucrânia e a hipocrisia geral dos dirigentes de OTAN, EUA e Rússia seguem como a tônica.
Os debaixo são os que mais sofrem e os trabalhadores tem tudo a perder dentro deste conflito de interesses capitalistas. Muitos perdem a vida, outros perdem casas, parentes e até são obrigados a irem a outros países. E ficam sequelas físicas e psicológicas.
A disputa pela hegemonia política regional e/ou global se abraça à disputa internacional de mercados e à alegria da indústria de armas. Essa guerra é uma expressão do capitalismo, que coloca o lucro acima da vida.
Putin não tem nada de progressista
Parte da esquerda segue fechando os olhos para questões importantes no conflito e sonha com um papel progressivo de Putin, candidato a czar pós-moderno. Apoiam Putin, mas não demonstram o que teria de progressivo, do ponto de vista dos interesses dos trabalhadores, essas disputas de Putin pelo território ucraniano.
Os trabalhadores também não ganham nada com essa aliança com chineses que só visa ganhar espaços na geopolítica internacional e ter mais comércio e, portanto, mais lucro.
Alguns acreditam no argumento infantilizado da “desnazificação”, quando ocorre justamente o contrário e o que menos importa a Putin é combater a direita extrema, ninho no qual coabita com seus amigos europeus (como a reacionária Le Pen na França), Bolsonaro e outros.
No sistema global do capital, diferentes blocos disputaram entre si fatias do mercado, pois o capitalismo é um sistema competitivo em essência. Os diferentes setores do capital utilizam diversas formas – a guerra é uma delas – de penetração e controle de novos territórios, sempre com o objetivo de ampliar seus lucros, de valorizar seu capital. E é só isso que Rússia e China estão interessadas.
A guerra só serve ao capitalismo
Voltando ao tema da guerra, a ofensiva russa se combina com complicadas negociações e alguns recuos a partir do final de março. O que se vê no rastro russo deixado é intensa destruição, especialmente em cidades como Mariupol praticamente reduzida a escombros e cinzas. Confirma-se o constante ataque do exército russo a alvos civis. Por isso, é legítima a resistência nacional ucraniana em função de sua violação territorial, trata-se de uma ação defensiva justa, apesar de Zelenski não merecer a confiança dos trabalhadores.
Ao que tudo indica Putin agora se concentra em conquistar a região de Donbass (Luhansk e Donetsk), Mariupol que fica nas proximidades de Donbass, criando uma faixa até Criméia que está anexada. Além desse “corredor”, essa região é mais industrializada do país, produtora de carvão e aço.
Tal ação ilegítima e desproporcional da Rússia apenas fortalece a OTAN – órgão capacho das potências imperialistas e seus aliados subservientes e medrosos – aos olhos médios da população mundial e os sentimentos russofóbicos nos setores mais conservadores, como os ultranacionalistas e neonazistas na Ucrânia. Também fortalece o direitoso governo ucraniano, aproximando a Ucrânia dos EUA e seus interesses.
Copiando o estilo putinista – ou seria o oposto?- Biden sugeriu que Putin deveria sair do poder russo, mais uma bravata típica da “democracia imperialista” que adora intervir em outras nações. Por sua vez, o desserviço putinista é imenso, mas ele segue saudado pelos politiqueiros da conciliação de classes da velha esquerda. Isso debilita até a posição russa sobre as justas reivindicações sobre sua soberania e caso consiga um bom acordo com os ucranianos será conquistado via força e com muito desgaste político e econômico externo e interno.
Só a classe trabalhadora pode deter Putin e parar essa guerra
Putin e suas práticas não são uma boa aposta para o futuro da humanidade. O papel russo neste conflito é reacionário e demonstra que não tem qualquer possibilidade de propor ao mundo nem mesmo um utópico ‘capitalismo de rosto humano’. Vemos sua violência agressora na destruição de cidades ucranianas, nas valas comuns e nos prédios bombardeados.
Para Biden, Putin e os grandes líderes mundiais o povo trabalhador, os jovens soldados e a população civil desarmada representam apenas um detalhe, um cálculo, um numero como bucha de canhão neste jogo de interesses capitalistas, ou seja, esbravejam contra Putin, mas na realidade torcem que a guerra se prolongue por causa dos interesses econômicos em jogo.
A nossa posição contra Putin não significa apoio ao governo ucraniano, pois o projeto de Zelenski é se aliar mais ao imperialismo. Defendemos que a classe trabalhadora ucraniana assuma a direção da resistência à invasão russa. Não se pode confiar nesses governos burgueses.
Qual a relação com a atual guerra na Ucrânia?
Nem todas as guerras são iguais. A 1ª Guerra Mundial se insere num contexto de conflito interimperialista, semelhante ao que ocorre entre Rússia e OTAN, neste momento. Mesmo que a Rússia não seja uma destacada potência imperialista global em todos os aspectos, seu potencial bélico a coloca, ao menos, como potência regional ou uma espécie de sub-imperialismo.
Portanto o que temos na Ucrânia é um conflito distinto da invasão do Vietnã ou do Iraque pelos EUA, por exemplo, quando uma nação imperialista agride outra absolutamente periférica, dependente e explorada e esta deve ter todo nosso apoio e solidariedade. Diferente disso, os socialistas não devem ter uma posição neste conflito diferente da derrota da invasão russa e das burguesias locais, sem nenhuma confiança em Zelenskis, OTAN, Bidens ou Putins da vida.
Lênin e a 1ª Guerra
A eclosão da I Guerra Mundial deixou claro que o otimismo da chamada “Bela Época” era ilusória, pois vivíamos um período de corrida armamentista por disputas importantes dos mercados globais na época também simbolizado pelo colonialismo direto. Era o fim de uma aparente fase áurea do capitalismo e um duro golpe para o socialismo em sua vertente reformista. A palavra de ordem “guerra contra a guerra” foi até 1914 a posição dominante dos partidos da II Internacional. Esse foi o compromisso assumido em diversos congressos anteriores à guerra.
Com a aproximação do conflito, em novembro de 1912, o bureau (direção) da II Internacional convocou um congresso extraordinário que se realizou em Basileia, na Suíça. Nesse encontro foi aprovado, por unanimidade, um manifesto que destacava os perigos da guerra que teria em si um caráter imperialista. A posição assumida pelos delegados no “Manifesto da Basileia” foi a de lutar contra a guerra.
Mais adiante, no entanto, alguns partidos, especialmente o alemão e o francês começaram a rever tal posição e a adotar a ideia “defensista”: chegam, em alguns casos, a votar nos parlamentos a favor dos créditos de guerra. Segundo este setor da esquerda da época, era preciso se colocar ao lado da burguesia nacional para defender a pátria de um suposto inimigo externo. Colocando o internacionalismo no lixo, os alemães justificavam essa política afirmando que nada poderia ser pior do que a vitória do império russo. Já os franceses, afirmavam que a vitória da Alemanha seria uma enorme derrota para os trabalhadores.
Ao defender tais disparates, os partidos socialdemocratas passaram a uma posição patriótica, estranha na tradição revolucionária ao menos presente desde o século XIX na 1ª Internacional. Era o fim dos princípios antimilitaristas e internacionalistas para este setor, mas também a motivação para uma reorganização das forças socialistas. Assim, em setembro de 1915, 39 militantes socialistas europeus de 11 países se reuniram no vilarejo de Zimmerwald, também na Suíça.
Sendo o primeiro encontro internacional após o início da guerra, se caracterizou como uma reunião independente que reuniu o italiano Ordino Morgari, Martov, Trotsky e outros militantes suíços. O objetivo da conferência era discutir uma saída contra a guerra a partir de uma orientação verdadeiramente internacionalista.
A maioria acabou adotando uma postura pacifista, contrária à guerra e ao social-patriotismo, mas sem uma proposta concreta que fosse além da luta contra a guerra. Uma minoria se aproximou de Lênin, também presente, que reafirmou sua crença no “derrotismo” adotando a palavra de ordem de “transformação da guerra imperialista em guerra civil” e na necessidade de uma nova Internacional.
Mesmo minoritária na ocasião, a proposta de Lênin se tornaria importante no futuro da Internacional e suas definições ante outras guerras. O “Manifesto de Zimmerwald” foi elaborado por Trotsky que concordava com a necessidade de uma nova internacional, embora ainda apresentasse resistência ao chamado “derrotismo”. No texto, a guerra foi apresentada como resultado dos conflitos capitalistas, dos governos burgueses e dos socialistas que traíram o internacionalismo se rendendo ao social-patriotismo. Era o primeiro passo rumo a 3ª Internacional.