O Partido Trabalhista foi o grande vencedor das eleições no Reino Unido, conquistou 412 assentos no Parlamento. Em uma das maiores conquistas eleitorais, atraiu votos dos que romperam com o Partido Conservador.
A derrota do Partido Conservador foi acachapante, obteve apenas 121 cadeiras no parlamento. Nunca foi tão mal. Os piores resultados tinham sido em 1906 (156 cadeiras); em 1997 (165 cadeiras) na eleição de Tony Blair e em 1832 (175 cadeiras). Pelo menos 12 ministros não foram eleitos em seus distritos, inclusive Liz Truss que havia sido Primeira-Ministra. Foi uma resposta aos 14 anos de muitos ataques dos governos conservadores contra a classe trabalhadora.
O Partido Liberal Democrata ocupou 72 cadeiras, ou seja, 64 cadeiras a mais. Um crescimento importante por ter atraído os eleitores de direita que não votaram nos Conservadores.
Outro fato importante dessas eleições foram os 14% de votos (cerca de quatro milhões de votos) que o Partido Reformista, de extrema-direita, conseguiu. É liderado por Nigel Farage, tem posições racistas contra os imigrantes e é defensor de posições fascistas. Também defende privatizar a Saúde pública, revogar os direitos trabalhistas, acabar com as leis de igualdade salarial entre homens e mulheres e acabar com o salário-mínimo, isto é, tirar direitos dos trabalhadores e deixar o caminho livre para que os ricos fiquem mais ricos.
Do ponto de vista da Esquerda Progressista há importantes resultados com a eleição de candidatos independentes como de Jeremy Corbyn (expulso do Partido Trabalhista) e de Shockat Adam contrário ao genocídio de Israel contra o povo palestino.
Eleição que expressa crise e falta de alternativas
Como vimos, o domínio do Partido Traalhista foi bem amplo, no entanto, se comparamos em termos percentuais (dados abaixo), a diferença entre Trabalhsiats e Conservadores não é tão grande como a quantidade de cadeiras conquistadas para o parlamento.
Mas, no Reino Unido o sistema eleitoral é bem diferente, os deputados são eleitos para a Câmara dos Comuns (Câmara dos Deputados no Brasil) pelo distrito que concorrem. São 650 distritos e de acordo com a população cada deputado represente um número similar de eleitores. Assim, nos países que formam o Reino Unido, a Inglaterra elege 533 deputados, Escócia 59, País de Gales 40 e Irlanda do Norte 18.
O candidato que obtiver mais votos representa o distrito. O partido que tiver maioria (326 deputados eleitos) escolhe o Primeiro-Ministro e governa. Então, é um sistema que tem distorções na representatividade dos partidos no parlamento.
Observar o percentual e a quantidade de votos é importante porque expressa a real influência eleitoral. No caso do Partido Trabalhista, por exemplo, com 9.731.363 (34%) conseguiu eleger 412 deputados. No entanto, os 40% dos votos das eleições de 2017, quase 13 milhões de votos, elegeram apenas 262 deputados. E nas eleições de 2019 com pouco mais de 10 milhões de votos elegeu 202 deputados.
Isso significa que, mesmo vitoriosos, os trabalhistas tiveram uma queda significativa em relação à eleição de 2019. E comparada com 2017, a queda foi ainda maior. Em ambas eleições o candidato do partido foi Jeremy Corbyn, que defendia propostas políticas mais progressivas.
Dessa forma, nos parece que os votos massivos para o Partido Trabalhista estão mais relacionados ao repúdio às políticas aplicadas pelos Conservadores nos últimos 14 anos, algo como “era o que tinha”, um “mal menor.
Em relação a uma alternativa antissistêmica de fato, no Reino Unido também prevalece – por vários motivos- a ausência de um partido de massas com posições socialistas revolucionárias, deixando a classe trabalhadora, em cada eleição, à mercê de partidos que só divergem no modo de fazer as mesmas coisas.
Partido Trabalhista está comprometido com o capital
A esmagadora vitória do Partido Trabalhista no Reino Unido foi saudada pela mídia como da esquerda. Mas, entendemos que pelo projeto político desse partido, não é bem assim. Mais do que gestor do Estado capitalista, quando no governo, foi responsável por aplicar pesados ajustes econômicos contra os trabalhadores.
Como em outros países, os partidos que se dizem esquerda eleitoral se diferenciam muito pouco da direita na forma de aplicar suas políticas. Com a crise do Estado de Bem-Estar Social na Inglaterra (serviços públicos de qualidade, maiores salários, etc.) o Partido Trabalhista cumpriu o papel de desmontar as conquistas sociais e de perseguir os imigrantes.
Nessa campanha eleitoral, Starmer reafirmou várias vezes o compromisso com os ricos e a continuidade do projeto político e econômico que o Partido Conservador estava aplicando. Após a vitória, já declarou que não haverá mudanças bruscas e buscou acalmar a burguesia, especialmente banqueiros, especuladores e construtoras. Logo em seguida, os principais empresários do país comemoraram e felicitaram a vitória eleitoral.
Keir Starmer representa a direita do Partido trabalhista
Starmer, primeiro-ministro, tratou logo de declarar que o “Novo partido Trabalhista” vai governar como “Novo Partido Trabalhista”. Essa frase é uma referência às mudanças no interior do partido que era dirigido pela ala dita de esquerda de Jeremy Corbyn, candidato nas eleições de 2017 e 2019 com um programa progressista.
Starmer assumiu o controle do partido e impôs uma política de direita com a punição de várias lideranças, expulsão dos que defendiam o povo palestino, acusando de serem antissemitas. Até mesmo Jeremy Corbyn foi impedido de ser candidato pelo partido em seu distrito, obrigado a se candidatar como independente foi eleito derrotando o candidato apoiado pela direção do partido.
Sob a liderança de Starmer e da ala direita, o partido passou a adotar posições políticas como a de apoio a Israel, inclusive, recusando condenar Netanyahu pelos ataques aos hospitais e escolas em Gaza.
Outra política, implementada pelos Conservadores, que o Partido Trabalhista dará sequência, é a da proibição do NHS (Serviço Nacional de Saúde, público) prescrever os chamados “bloqueadores de puberdade” (tratamento que atrasa ou suspende o início da puberdade, inibe a produção dos hormônios das mudanças físicas como seios, pelos, etc.) utilizado pela população transgênera para ressignificação sexual.
Esse partido também tem uma longa tradição de aliança com o imperialismo estadunidense. No governo Tony Blair, a Inglaterra apoiou e participou ativamente da invasão do Iraque e Afeganistão, operação que matou centenas de milhares de pessoas. E ainda podemos dizer que o apoio inglês aos sionistas no golpe de Estado na Palestina, em 1948 e na criação do Estado de Israel, foi sob um governo trabalhista.
Como se diz, um partido se mede pela suas ações.
Sem tolerância com o novo governo trabalhista
O giro à direita do Partido Trabalhista arrastou alguns dirigentes sindicais e muitos já pedem cooperação com o novo governo. Starmer não esconde de ninguém suas intenções contra a classe trabalhadora.
Os 14 anos de governo conservador deixaram o lastro de perdas de direitos, achatamento salarial e redução de serviços públicos. Esse governo, no mínimo, deveria apresentar propostas de restauração desses direitos e de recomposição dos salários.
Em relação ao direito de greve, a exigência do movimento é para que o Partido Trabalhista revogue a Lei Sindical de 2016, que exige a participação de 50% dos trabalhadores nas votações de greve. Pelo tom do governo, será preciso muita luta para garantir a revogação total dessa lei.
Outra luta importante, tem atraído massas de pessoas na Inglaterra, é a defesa do povo palestino com a exigência de deixar de fornecer armas para Israel matar palestinos. A esquerda socialista inglesa tem defendido a necessidade de lutar contra o novo governo para que rompa com Israel, que se oponha à guerra, deixe de deportar imigrantes, revogue as leis racistas, para que aumente salários acima da inflação e benefícios, por mais empregos, por ações ambientais, financiamento integral do NHS (Sistema Nacional de Saúde), por moradias populares, pelos direitos das mulheres e da população LGBT+ e das várias formas de violência.
Extrema-direita é um perigo real
A extrema-direita é realidade em várias partes do mundo. A América Latina contou com Bolsonaro e hoje com Milei. Os Estados Unidos com Donald Trump. A Europa com os expressivos resultados eleitorais na França, Itália, Reino Unido, Espanha e Portugal. E em Israel com o governo Netanyahu, um dos mais assassinos e apoiado por milhões de ultradireitistas.
Desde a II Guerra Mundial, é o momento que esse setor mais consegue apoio. Diante de uma crise social e econômico do capitalismo que joga milhões de pessoas para o desemprego, para o trabalho formal, reduz o salário e tira qualquer perspectiva de uma vida digna, muitas pessoas procuram respostas para entender como a situação chegou a esse ponto.
E a extrema-direita hoje, como Hitler e Mussolini no passado recente, se apoia nessa realidade social, econômica e cultural para dar explicações falsas para esses problemas. Culpa os imigrantes pelo desemprego e diz que os serviços públicos prejudicam parte da população. Dessa forma, consegue desviar o foco dos problemas e consegue apoio como vimos nas eleições francesas e do Reino Unido. Nos EUA com Trump e Kamala Harris o problema também se apresenta, não podemos crer que fazer aliança com “burgueses progressistas” deterá a extrema-direita. Só com a mobilização da classe trabalhadora e de forma independente a extrema-direita poderá ser contida.
O grande desafio da esquerda socialista é conseguirmos construir as lutas com a classe trabalhadora para rompermos essas barreiras, responsabilizarmos todos os setores da burguesia, desde a “direita tradicional” até a extrema-direita pela crise causada pelo sistema capitalista. Nesse sentido, nós da Emancipação Socialista reforçamos a necessidade de construirmos e ampliarmos a unidade da esquerda revolucionária para avançarmos nesse diálogo com a classe trabalhadora e nas lutas.