Dede junho de 1998 tramitava uma ação para mudar o regime jurídico dos servidores públicos, a Emenda Constitucional 19. Julgada pelo STF, saiu vitoriosa em 6 de novembro alterando regras para os futuros contratados do Funcionalismo Público no Brasil, que poderão estar sujeitos às normas da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas).
Na prática isso significa, dentre outras mudanças, a quebra da estabilidade para aqueles que vierem a ingressar no funcionalismo público no futuro, caso os Executivos dos âmbitos federal, estaduais e municipais decidam seguir a decisão da Suprema Corte.
Quebra do RJU marca o fim de uma era no serviço público
O que está em jogo, portanto, é o fim do Regime Jurídico Único, em vigor desde 1988 com a Constituição Federal atual. Podemos dizer que até o momento deu-se uma era de maior credibilidade no Serviço Público. Resquícios do regime anterior, onde era comum a indicação para cargos de todos níveis (vulgarmente conhecida como “QI: quem indica” ou “entrar pela janela”) ainda ficaram nítidos em eventos conhecidos como a campanha de Fernando Collor à presidência do Brasil em 1989 em que o mesmo se autointitulava “caçador de marajás” por sua atuação como governador de Alagoas contra a acumulação de salários exorbitantes por parte de alguns servidores públicos de lá.
O governo do neoliberal Fernando Henrique Cardoso, contraditoriamente, foi um momento de consolidação dos concursos públicos no país pois preocupou-se em conferir espaço, a partir das medidas de seu ministro Bresser Pereira, ao modelo de administração pública gerencial em lugar da burocracia. Na verdade, o que ainda existia fartamente era um modelo patrimonialista que, no papel ao menos, havia sido extinto com a Constituição de 1988 que preconizou o ingresso no serviço público exclusivamente via concurso.
Essa noção do servidor público como alguém ligado ao poder, no entanto, tem permanecido por todo o período democrático do país. Mais do que garantidor dos serviços públicos à população, o servidor é geralmente considerado pela massa cada vez mais precarizada uma espécie de privilegiado, mesmo que, em sua maioria, receba salários baixos.
Porém, será a totalidade da classe trabalhadora que sofrerá os impactos negativos da decisão do Supremo Tribunal Federal. E não é apenas no sentido dos futuros empregos que os filhos dos trabalhadores podem vir a buscar nos concursos públicos, mas na oferta e na qualidade dos serviços.
A precariedade dos serviços públicos no neoliberalismo
A estabilidade do servidor não é uma medida de proteção para ele exclusivamente. Ela existe para que o trabalho a ser realizado não seja comprometido por decisões de governo, perseguições de cunho político ou de outra ordem (em tempos de enfraquecimento do Estado laico até perseguição religiosa pode ser incluída neste ponto). Ou, seja, a estabilidade serve para impedir que políticas públicas ou serviços que são oferecidos à população sejam simplesmente interrompidos. Bolsonaro em seu mandato como presidente do país defendeu que servidores deveriam ser exonerados para a colocação de pessoas de confiança a cada novo governo. Isso seria um cenário de caos pois empacaria ações em todos os níveis: na Saúde, na Justiça, na Educação, no Meio Ambiente…
Em O Estado e a Revolução, Lênin discorre sobre a transformação do velho aparelho estatal em um novo a partir do poder dos sovietes. O que nós socialistas almejamos, com os ensinamentos da Revolução de Outubro por ele liderada, é algo diferente de um Estado. Este é e sempre será um órgão de dominação de classe. Porém, nas democracias burguesas a estabilidade é necessária para que um mínimo seja feito pela população.
A decisão do STF atende a interesses da classe dominante
A quebra na obrigatoriedade do RJU é um exemplo de que Engels e Lênin estavam certos ao considerar que o Estado é um órgão que serve apenas para gerir a dominação de uma classe sobre as demais. O governo Lula-Alckmin e sua tentativa de ser um mero conciliador entre as classes vem demonstrando explicitamente a quem realmente serve: aos grandes capitalistas.
Mesmo sendo mantida realização de concursos públicos para o preenchimento de pessoal nos serviços públicos, a brecha aberta pela possibilidade de contratações feitas de outras maneiras colocará os futuros funcionários reféns de decisões política. Quanto à população que depende dos serviços, estará cada vez mais exposta à baixa qualidade dos mesmos, podendo até ficar à deriva, sem acesso, conforme os interesses dos políticos de algum setor ou local.
Só com um real engajamento da classe trabalhadora venceremos mais esta medida cruel dos neoliberais!