Em dezembro do ano passado, o governo alemão (composto pelos Social democratas, liberais do livre mercado FDP e pelos Verdes), liderado por Olaf Scholz, depois de perder a maioria no Parlamento, foi obrigado a convocar novas eleições, as quais vão ocorrer no próximo dia 23 de fevereiro.
Essa crise política fez emergir os vários problemas econômicos, sociais e políticos no país, lembrando que outros países europeus também passaram por crises desse tipo recentemente, como foram a Inglaterra e a França.
O descrédito nos partidos tradicionais da Alemanha (que se revezam no poder com medidas impopulares) é uma das expressões dessa crise e com isso abriu espaço para a extrema-direita se recolocar no cenário político com força. As recentes pesquisas indicam depois de quase 80 anos da derrota do nazismo esse setor terá uma votação recorde. Além das consequências dessa perigosa força eleitoral, certamente haverá uma nova situação política não só na Alemanha, mas em toda Europa.
O principal partido da extrema-direita alemã é o partido Alternativa para a Alemanha (AfD) e tem um discurso forte contra os imigrante, defendendo que as fronteiras devem ser fechadas para as pessoas sem documentos válidos, inclusive aqueles com pedidos de asilo (proteção jurídica para perseguidos nos países de origem).
Para complicarem as coisas, nos últimos dias, o CDU (União Democrata-Cristã), de direita e liderado por Friedrich Merz se aproximou da Alternativa para a Alemanha (AfD) e votaram juntos numa resolução contra os imigrantes, colocando a possibilidade concreta de o próximo governo ser formado com os Conservadores e a extrema-direita.
Essa unidade impactou a Alemanha não só por conta dessa medida reacionária, mas também pela possibilidade de, caso caminhem para um novo governo, ser uma reviravolta histórica, uma ruptura do pacto político chamado “Cordão sanitário” -firmado depois da derrota do nazismo-, um acordo entre os principais partidos alemães para impedir a extrema-direita de fazer parte do governo novamente.
O futuro repetirá o passado?
Pelas pesquisas mais recentes, o CDU (União Democrata-Cristã, de direita) está com 28%, a AfD (Alternativa para a Alemanha, extrema-direita) com 20% e o SPD (Partido Social Democrata, do atual chanceler Olaf Scholz) tem 16%. Se esses números demonstram uma forte polarização também há a indicação de que a maioria dos eleitores está tendendo a posições mais à direita.
Na música “O tempo não para”, Cazuza solta a frase “eu vejo o futuro repetir o passado”, se referindo de como, apesar de mudanças importantes, o conservadorismo ainda é muito forte. Essa frase mostra bem as terríveis consequências do aumento da influência política desses setores e se conseguem chegar ao poder, recolocando um cenário de ditaduras, perseguições, guerras, etc.
É de fato um assunto para continuarmos prestando atenção, pois ele também ocorre numa região que teve a traumática experiência de duas guerras mundiais (milhões de mortos, a barbárie, destruição física de vários países, a reconfiguração mundial etc.). Ainda que há importantes focos de resistência, o fato é que presenciamos o crescimento da extrema-direita (com um perfil cada vez mais próxima do nazi-facismo) em vários países da Europa e com importante apoio popular, inclusive entre setores da juventude.
No nosso modo de ver, se trata de um fenômeno mundial e suas causas estão relacionadas a crise social (desemprego, precarização ou fim dos serviços públicos, falta de perspectivas no futuro) provocada pelo capitalista. Somando a isso uma importante crise da alternativa socialista, período histórico que as pessoas ainda não enxergarem a possibilidade de um novo tipo de sociedade e sucumbem ao “discurso fácil” da extrema-direita que joga a responsabilidade sobre os imigrantes, sobre países pobres (como Trump faz nos Estados Unidos), quando na verdade tudo isso é consequência do próprio capitalismo.
Há resistência: centenas de milhares ocupam as ruas na Alemanha
Outra parte dessa realidade na Alemanha é o crescimento da resistência com protestos gigantes, bloqueios de ruas e até ocupações. Nos últimos fins de semana foram centenas de pessoas nas ruas das principais cidades alemãs. Berlin, Colônia, Hamburgo, entre tantas outras.
É uma resposta importante e com a classe trabalhadora entrando em cena e se somando aos jovens e imigrantes em luta, esse jogo pode virar e formar uma consciência do significado de um próximo governo formado pela direita e extrema-direita, não só para os imigrantes, mas para todos, pois esses reacionários são contra todo sistema de proteção social conquistado pela classe trabalhadora alemã, colocando na mira dos ataques deles os direitos sociais e trabalhistas que ainda existem.
Nesse movimento há a participação de sindicatos, movimento ecologistas e o movimento estudantil está organizando assembleias antifascistas nas universidades e bloqueios de ruas. Em cidades operárias como Hamburgo, a mobilização está bem forte. Outro elemento importante é que se mobilizam não só contra a Alternativa para a Alemanha (AfD), mas também contra a União Democrata-Cristã (CDU) que se aproximaram politicamente nos últimos dias.
O fortalecimento desse movimento e a construção de algo novo de fato, dependerá de seguir um caminho que rompa também com o Partido Social Democrata (que aplica a mesma política econômica da direita e se coloca a favor do Estado de Israel contra os palestinos) e pode ser um elemento qualitativo, servindo de inspiração e fortalecimento da classe trabalhadora europeia e até de outros países pelo mundo que estão enfrentando a extrema-direita (Estados Unidos, Argentina, entre outros).