A independência sob controle da classe dominante
O 07 de setembro, mais do que uma data histórica, é um convite à reflexão radical sobre o processo de dependência socioeconômica da nação brasileira, bem como sobre o papel das organizações políticas no campo da esquerda, sobretudo, da fração que defende a ação revolucionária, no sentido de extrair as lições desse momento histórico.
Um ato sob controle da Coroa e de caráter nacionalista duvidoso, longe de promover a emancipação política, mergulhou o país em um endividamento externo que dura até os dias atuais, marcado pela dependência econômica e pelo reforço de relações patriarcais, racistas e de exclusão já existentes.
Do ponto de vista factual, no período de transição para o chamado “grito de independência” (veja nota 1), um dos principais objetivos da classe dominante era evitar o risco de repetir aqui uma revolução como a que ocorreu no Haiti (veja nota 2). Dessa forma, era preciso insuflar os ânimos populares, mas, apenas o necessário para acabar com o sistema colonial de modo gradual, sem abalar o poder dominante e principalmente, para promover a liberação e ampliação das relações comerciais com outros países, até então marcadas pelo comércio triangular (veja nota 3) e sob controle da metrópole.
A Independência parou no meio do caminho
O 07 de setembro só pode ser devidamente apreendido, quando analisado à luz do antagonismo entre capital e trabalho, pois, colocou sob novas bases, não só a dependência – da dependência colonial de tipo clássico à dependência econômica de novo tipo –, como as relações de produção que precisavam ser liberadas, entre outras coisas, das amarras do regime escravista. Portanto, a independência formal decorrida desse processo, na verdade, serviu para abafar as revoltas provinciais, as insurreições de indígenas e dos negros libertos e escravizados.
Por seu caráter heterogêneo – reunia liberais, abolicionistas, nacionalistas entre outros – o movimento amplo que levou à Proclamação da Independência tinha em sua base diferentes e contraditórias bandeiras políticas e econômicas, e todas, sem exceção, expressavam a oposição entre capital e trabalho manifesta nas transformações nas relações comerciais e de produção que estavam ocorrendo naquele momento, cujo objetivo da classe dominante não era o desenvolver a Nação, mas, a consolidação do processo de acumulação primitiva de capital e gênese do capitalismo.
A (in)dependência forjou relações, em essência, anacrônicas que a despeito do apelo à soberania, na prática inviabilizaram o desenvolvimento de longo prazo do país.
Caracterizou-se também por uma perspectiva limitada de emancipação, pois confinou no âmbito da legalidade a agitação revolucionária marcante no período e logo em seguida reprimindo indígenas, a população negra e mulheres, a exemplo de Maria Felipa, Joana Angélica e Maria Quitéria procurando evitar que o processo não avançasse, por exemplo, contra o trabalho escravo, base da riqueza social apropriada pelos senhores escravistas, os quais eram fundamentais na sustentação do Império.
Um exemplo atual deste confinamento da ação revolucionária nos marcos da legalidade, é o quadro político do Chile, onde a massa do povo que lutava foi convencida a trocar a arena de disputa na luta de classes. No lugar de ocupar as ruas, foram reduzidos a poucos representantes no interior da constituinte, mas a despeito de terem elaborado um texto constitucional avançado, derrubando diversos dispositivos da política neoliberal, a burguesia conseguiu rejeitar a proposta, e, infelizmente, os representantes não estão mais ancorados pela massa nas ruas para fazer pressão em sentido contrário.
Uma burguesia dependente economicamente
Neste bicentenário da (in)dependência do Brasil, o que se destaca, na dinâmica social brasileira, é o estado permanente de dependência frente à ação parasitária e imperialista da burguesia na quadra atual de financeirização do capital.
Para além da falácia da soberania, se é correto afirmar segundo Engels que o “Estado é o produto e a manifestação do caráter inconciliável das contradições de classe”, então é verdadeiro afirmar que não há emancipação onde a sociedade se manifesta dividida em classes sociais antagônicas e a existência do Estado, exatamente expressa que essas contradições não podem ser conciliadas. Disto resulta que só a ação revolucionária promove a emancipação do gênero humano das relações de tipo capitalistas marcadas pela exploração da força de trabalho e a opressão dos setores sociais que lutam por autodeterminação.
Contraditoriamente, no 07 de setembro deste ano, a palavra de ordem foi a defesa da democracia tendo seu corolário nas eleições de outubro, uma consigna sedutora que engessa a ação dos trabalhadores e a confina nos marcos do direito burguês.
Obviamente que não se deve desejar a ditadura ou a autocracia apregoada pelo chefe de Estado de plantão, mas, não se pode vender a ilusão de que a democracia da burguesia é o objetivo máximo a ser alcançado. Por essa lógica a democracia do voto passa de mera trincheira na linha de defesa no interior da guerra de classes, para se transformar em todo o território a ser protegido, e, seguindo esta metáfora, os principais alvos a serem defendidos seguem desprotegidos.
A democracia burguesa é o máximo que se chega com a emancipação política, é o limite possível dentro do Estado burguês, uma expressão da política de conciliação entre as classes. Ocorre que, segundo Marx, o “Estado não poderia nem surgir nem manter-se se a conciliação de classes fosse possível”, destarte, o direito burguês assegura tão somente a manutenção do poder de Estado que em suma é o poder de uma classe sobre outra.
Nota 1: A imagem do grito às margens do Ipiranga em São Paulo, embora, ocupe as principais páginas dos livros de história, e as telas nas galerias de arte na verdade foi apenas um ato figurativo, antes disto, em 02 de setembro no Rio de Janeiro, a princesa regente Maria Leopoldina, assinou o Decreto de Independência. Uma independência que custou 2 milhões de libras esterlinas emprestadas pela Inglaterra, e manteve a monarquia.
Nota 2: Segundo carta de Maria Leopoldina, a conjuntura política da época era convulsiva: “Pedro, o Brasil está como um vulcão. Até no paço há revolucionários. Até oficiais das tropas são revolucionários”. Domínio Público)
Nota 3: O comércio triangular, segundo Santos Neto (2015), era uma das formas de garantir a supremacia comercial da metrópole pela mediação do comércio de gente. No caso brasileiro, os navios saiam de Portugal, iam até a África onde compravam ou capturavam escravizados e que depois seriam trocados por açúcar e este por produtos manufaturados: “O senhor de engenho estava submetido a uma contradição, se não comprasse escravos ao traficante, este não lhe compraria o açúcar. Eles eram obrigados a comprar escravizados dos traficantes que em troca lhes compravam o açúcar e lhes vendiam produtos manufaturados” (FREITAS, 2004).
Como falar de independência com tantos problemas sociais?
Há uma profunda crise econômica. 33 milhões de pessoas passam fome e 125 milhões não tem alimento suficiente. 15 milhões de desempregados. E quase 40 milhões de pessoas estão no trabalho informal, isto é, sem nenhum direito trabalhista.
São milhares de pessoas morando debaixo de viadutos e nas calçadas, muitas vezes famílias inteiras com crianças e idosos. Mais de 680 mil pessoas morreram com a COVID, muitas das quais poderiam ser evitadas com a vacinação.
É um histórico do Brasil que se agravou com o governo Bolsonaro que sempre desprezou a vida do povo trabalhador.
Mas, há o Brasil dos ricos. São 62 bilionários (mais de um bilhão de dólares) com um patrimônio total de mais de R$ 600 bilhões. Um punhado de pessoas que fica com a maior parte da riqueza produzida pela classe trabalhadora. Só os 20 mais ricos, eles possuem uma riqueza igual a 128 milhões de brasileiros.
Os ricos têm tantos privilégios que nem pagam impostos dos seus iates, jatinhos e helicópteros.
Não há Independência com tanta miséria e desigualdade social.
A Independência será obra da classe trabalhadora
Entendemos que a Revolução Socialista é o único caminho para mudar essa situação econômica e social e também para alcançar uma verdadeira independência nacional. A burguesia brasileira defende a independência nacional “só da boca para fora”, sempre de joelhos diante das potências estrangeiras, aceitando todas as imposições. São muitos exemplos de sua submissão aos países ricos: as multinacionais atuam no país, exploram os trabalhadores brasileiros e mandam a riqueza produzida aqui para as matrizes; o pagamento da dívida pública (interna e externa) já saqueou trilhões e trilhões de dólares do país; e o agronegócio exportando a maior parte da produção de grãos e carnes enquanto o nosso povo passa fome, etc.
Parte da sustentação do Estado burguês, os militares brasileiros, além de tratar o povo como inimigo, também são totalmente submissos às Forças Armadas dos Estados Unidos, recebendo formação (ideológica e técnicas militares) na “Escola das Américas”, local de treinamento de vários golpistas e realiza exercícios militares sob comando estadunidense, etc.
O interesse material e econômico dessa submissão é a possibilidade de exportar as matérias-primas e os produtos agrícolas para as burguesias imperialistas. Ampliar o processo de independência e defender os interesses nacionais significaria enfrentar as burguesias dos países industrializados e o risco de perder esse mercado, ou seja, uma relação de dependência. Assim, o projeto nacional arquitetado pela burguesia brasileira se amparou nessa subordinação e na repressão contra a classe trabalhadora, pois a luta pela independência nacional também significa o fim dos seus privilégios.
Por esses e muitos outros exemplos afirmamos que só a luta da classe trabalhadora, a maior vítima desse modelo, pode conquistar uma independência nacional de fato, construir um país soberano e garantir que a riqueza produzida sirva para atender as necessidades do nosso povo.
Fora Bolsonaro e todo o seu governo!
Um programa radical para acabar com a fome, a miséria e o desemprego!
A Revolução Socialista é o caminho para a Independência Nacional.