Após quatro anos de uma Copa do Mundo na Rússia, um país de extrema violência contra a classe trabalhadora e sem direitos a setores oprimidos como as LGBT+’s, a FIFA decidiu sediar o novo evento no Catar, país no Oriente Médio regido por uma ditadura que possui ainda mais restrições aos direitos trabalhistas e com leis bem mais punitivas aos setores oprimidos como mulheres e LGBT+’s (inclusive com pena de morte para homossexuais!).
A falta de direitos trabalhistas e as mortes de trabalhadores na construção da Copa
O padrão FIFA para construção de seus megaeventos é bem conhecido pelos brasileiros desde que se organizou a Copa de Mundo no nosso país em 2014. Se sabemos todos os problemas sociais que decorreram aqui em função daquele evento, obter informações de outro Mundial, agora em um país que vive uma ditadura que controla os dados, é muito mais difícil. Porém, diversas entidades tentam acumular informações para entender o que ocorre no Catar.
Segundo a ONU, a pressão por mudanças, para ter mínimas leis trabalhistas no Catar, teve avanços, como a mudança no sistema kafala, a de não mais proibir imigrantes de mudarem de emprego sem autorização de seus empregadores. Porém, mesmo com essa alteração, os donos de empresas no Catar continuam ameaçando seus trabalhadores com formas de suspensão de seus vistos no país para manter a superexploração.
Somente em 2021, o Catar definiu o salário-mínimo no país e, mesmo assim, não garante que os trabalhadores recebam em dia, tendo ainda a questão do valor desse salário que precisa ser revisto para se adequar às necessidades da população. Apontamos ainda que o país não possui qualquer legislação para o trabalho doméstico.
Mas ainda tem uma importante discussão em pauta que é a segurança do trabalho (principalmente, nas obras da Copa). Em relatórios de diversas entidades, esses valores variam de 6000 a 15000 mortos. Porém, o relatório oficial da FIFA pontua somente 3 mortos. A variação grande do número de vítimas do trabalho precarizado do Catar tem como ponto central a falta de dados oficiais coletados e divulgados pelo governo do Catar. As mortes registradas pela FIFA dizem respeito aos acidentes registrados nas obras do evento, mas ignoram outros que ocorreram em outras estruturas construídas para o mundial como hotéis, rodovias etc. Além disso, há também registros de óbitos sem esclarecimentos de causa da morte, com informações como paradas cardiorrespiratórias ou insuficiência renal, sem informar o que causou essas condições. Relatórios de organizações que defendem direitos trabalhistas pontuam que a insolação, exaustão e doenças menores podem causar as mortes súbitas. Há inclusive denúncias de trabalhadores imigrantes (maioria do Nepal e de Bangladesh) de que são escondidos, quando ocorreram as fiscalizações da FIFA.
As mais absurdas violações de direitos humanos que ocorrem no Catar
Como já apontamos acima, o Catar possui lei de pena de morte em situações de espionagem e crime contra a segurança do país, além disso renegar a religião muçulmana, práticas homossexuais e blasfêmia também são crimes passíveis dessa punição.
A questão da diversidade sexual e de gênero ainda é alvo de leis extremamente severas que proíbem manifestações de pautas e comportamento associados a LGBT+’s, com punições que variam de chibatadas (!) à prisão.
Em relação às mulheres, não podem fazer praticamente nada sem autorização de uma figura masculina de sua família (pai, marido, irmão) seja se casar, trabalhar, estudar, viajar ou até para receber cuidados reprodutivos. Vemos inclusive nas arquibancadas nos jogos da seleção do Catar que não há mulheres desse país vendo os jogos, sendo uma prática exclusiva masculina.
A reação às violações de direitos no país
Ainda que não ocorra protestos pelo Catar (como ocorreram no Brasil em 2014), a situação é ainda mais grave! Os jogadores estão sendo censurados para manifestações de apoio à causa LGBT+ (proibidos de usar braceletes com as cores desse movimento), mas isso não impede que eles façam algumas ações contra esse autoritarismo.
Já podemos ver algumas seleções se posicionando nesse sentido como a Inglaterra e a Alemanha que organizaram ações para ressaltar essa violação aos direitos humanos. Tem ainda a seleção do Irã que se negou a cantar o hino do país no seu primeiro jogo (contra Arábia Saudita), lembrando que os iranianos foram às ruas recentemente contra o governo de Ebrahim Raisi pela liberdade e direitos das mulheres. Todos os protestos têm sido censurados pela transnacional Fifa. Houve protestos novamente no segundo jogo do Irã (contra o País de Gales). Desta vez dois torcedores tiveram objetos confiscados: um homem com uma bandeira iraniana com a frase liberdade para as mulheres e uma mulher que maquiou o rosto com lágrimas em preto em alusão à jovem morta pela polícia iraniana em setembro.
A entidade que dirige o futebol mundial, ao mesmo tempo que esconde protestos contra a opressão à comunidade LGBTQI+ e às mulheres, tem um outro comportamento totalmente distinto para as grandes corporações capitalistas que faturam com a propaganda no evento. Não é gratuito que os acréscimos têm sido bem maiores nesta Copa, o que beneficia a propaganda das empresas nas transmissões das partidas. Tudo que era espontâneo no futebol vai se perdendo quando o esporte vira um grande negócio: até figurantes foram contratados para serem “torcedores” de países com menos tradição na competição e, em consequência, menos torcida.
A visibilidade que o Mundial deu ao Catar, para além da alegria do futebol, também nos mostra a desigualdade em termos de direitos sociais. Países extremamente conservadores como o país sede da Copa sequer têm leis para regular o trabalho da classe trabalhadora local, que precisa de todo o apoio para superar essas condições de barbárie e de massacre.
Não é à toa que muitos estão lembrando que já houve copas do Mundo sediadas na Itália Fascista em 1943 e na Ditadura Argentina em 1978. Além disso, podemos observar que as equipes elogiadas por sua técnica e inteligência são, em sua maioria de países europeus, com um passado de Colonialismo e disseminação de teorias racistas que deixaram como legado a esta extrema desigualdade do mundo. Os craques de países pobres, como qualquer outro produto da Indústria Cultural capitalista, são vendidos para clube europeus e só representam seus países de quatro em quatro anos.