Até quando seguirá a ofensiva reacionária?
“A escalada violenta dos atos criminosos resultou na invasão dos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso e do STF, com depredação do patrimônio público, conforme amplamente noticiado pela imprensa nacional, circunstâncias que somente poderiam ocorrer com a anuência, e até participação efetiva, das autoridades competentes pela segurança pública e inteligência, uma vez que a organização das supostas manifestações era fato notório e sabido, que foi divulgado pela mídia brasileira”.
O trecho da decisão de Alexandre de Moraes acima, quando ele retira o governador Ibaneis Rocha de seu posto no DF, pode bem ser um resumo da ação reacionária dos bolsonaristas em 8 de janeiro.
Nos dias anteriores, dezenas de ônibus lotados de “golpistas” se dirigiram à Brasília para reforçar o acampamento instalado há meses em frente ao QG do Exército, sem que o conivente comando do exército tomasse qualquer medida, pelo contrário, a simpatia era declarada. A preparação dos atos de invasão foi bem articulada previamente e razoavelmente pública. Em 12 de dezembro uma caminhada desse setor já havia terminado numa tentativa de invasão da sede da Polícia Federal.
No dia 8 de janeiro, a PM chegou a escoltar a turba reacionária até a Esplanada dos Ministérios: quando começaram a avançar para invadir os prédios, não encontraram resistência do pequeno efetivo policial, inclusive houve colaboração das forças de repressão, membros do exército e da PMDF, conforme várias imagens e depoimentos. Em entrevista para a GloboNews, mesmo Lula reconheceu a falha gritante da inteligência das Forças Armadas, da Abin e do GSI em prever e se preparar frente aos acontecimentos.
Visivelmente há setores das forças armadas que defendiam uma ruptura, apoiando as intenções da massa bolsonarista. A questão é que nem a grande burguesia e nem o imperialismo apoiariam um golpe.
A extrema-direita conta com apoio de um setor minoritário da burguesia
Cabe reforçar que o 8 de janeiro foi um pico de um processo iniciado ainda na noite do segundo turno com o questionamento do resultado que elegeram Lula. Para esse setor nem o moderado governo gestado pelo PT e sua “aliança ampla” pode ser tolerado. Querem um governo liberal que retire mais direitos dos trabalhadores e restrinja ainda mais a frágil democracia burguesa brasileira. Querem as festas dos mais ricos, do agro, dos banqueiros e milionários.
A extrema-direita brasileira tem sido um dos setores mais dinâmicos na conjuntura, pautando o debate político nacional e com várias ações que mobilizaram um setor importante. Estiveram por cerca de 70 dias na frente de quartéis em todo país, prepararam o ataque aos prédios na esplanada, revelando um esquema organizado, com patrocinadores e muito ativo. Sem falar na capacidade de mobilização nas redes sociais.
A ação de 8 de janeiro saiu derrotada, mas mostrou uma extrema-direita forte, enraizada e articulada. Felizmente, mesmo com tal força, não conseguiu nesses meses deslegitimar o resultado das urnas, apesar do bloqueio de estradas, acampamentos em frentes aos quartéis, protestos pelo país e essa “ação final” no DF.
As ações bolsonaristas devem ser chamadas pelo seu nome: um projeto golpista, de um setor da classe dominante formado por madeireiros, garimpeiros, parte do agronegócio e empresariado do setor varejista, além de militares da reserva e da ativa. E também contam com algum respaldo na classe média e também de trabalhadores.
Ficou nítida a colaboração do oficialato das Forças Armadas e do governo do DF: ainda piores foram as declarações de José Múcio, Ministro de Lula, considerando os acampamentos golpistas como “democráticos”. Tal Ministro parece se assemelhar a um estranho no ninho ou será que cabe no governo de Frente Ampla?
Uma nova conjuntura
O 8 de janeiro, abriu uma nova conjuntura. Em certo sentido, Lula se fortaleceu politicamente, estabelecendo uma unidade ainda maior para defender seu governo de Frente Ampla conta o golpismo reacionário. Rapidamente os 27 governadores (as) se reuniram, os Poderes Judiciário e Legislativo unanimemente defenderem a ordem constitucional e a comunidade internacional, rapidamente, repudiou qualquer possibilidade de mudança reacionária no regime, um fator decisivo para que a esfarelada democracia burguesa continue se arrastando.
Bolsonaro e outros membros do seu governo saem desgastados no geral e cada vez mais ameaçado a responder criminalmente por esse e outros tantos atos. Anderson Torres – ex Ministro da Justiça- é um deles.
E a extrema-direita, sob pressão das diversas instituições, também perdeu força. O mais provável é que esses acontecimentos diminuem o ímpeto da extrema-direita, considerando que perdeu apoios importantes inclusive entre eleitores de Bolsonaro que não comungam com as tais práticas radicais golpistas escancaradas.
A troca do comandante do exército só foi possível primeiro porque as forças armadas, pelo apoio que deram ao governo Bolsonaro, também se enfraqueceram e, segundo, por Lula ter se fortalecido.
A resposta para derrotar golpistas e extrema-direita
Logo no dia 9 houve reação com atos em várias cidades brasileiras sendo embrionariamente uma boa resposta aos golpistas: milhares foram às ruas como um contraponto às intenções dos bolsonaristas. Vale ressaltar os atos de São Paulo e Porto Alegre, com 50 mil e 10 mil presentes, respectivamente. Tais iniciativas devem seguir e também buscar ampliar a organização desde a base em fóruns de luta unificados contra os golpistas e em defesa das liberdades democráticas.
É possível passar à ofensiva contra os golpistas, mas não apenas apostando nos marcos institucionais e sim mobilizando o movimento social de conjunto. Também é fundamental exigir a prisão dos organizadores, dos principais milicianos, financiadores e os membros das forças armadas e das polícias militares que deram algum tipo de apoio. É preciso lutar contra a tutela militar do país, processo que retroage ao fim da ditadura militar (ver boxe).
Para sangrar a extrema-direita também é necessário desmontar a rede de financiamento, relacionada à atividade predatória das milícias de latifundiários, garimpeiros, madeireiros, parte do empresariado, etc. grupos que viviam na boa durante o governo Bolsonaro.
Ainda, a bandeira “sem anistia” deve ser uma campanha profunda para romper a histórica conciliação para “resolver os problemas” políticos do país. Os crimes dos poderosos devem ser punidos para inverter a lógica de punir apenas periféricos, favelados, negros e pobres. Esses que são empurrados para a criminalidade como questão de sobrevivência, diferente das cúpulas ricas desse país.
Enfim, para deter os golpistas e ir a fundo na exigência do “ajuste de contas”, a luta auto-organizada da classe trabalhadora, da juventude e de todo o povo será decisiva. É preciso tomar as ruas e fazer frente a extrema-direita e defender as liberdades, direitos sociais e democráticos ameaçados pelo liberalismo bolsonarista.
A ação dos Petroleiros em defesa das refinarias é outro bom exemplo para destacarmos, assim como a movimentação política das torcidas organizadas, mais uma vez.
É preciso construirmos, enfim, um plano de lutas que possa constranger e fazer recuar qualquer ímpeto golpista. Tudo indica que há espaço para isso, desde que se abandone a perspectiva governista e ainda um tanto festiva de parte do ativismo. O momento é sério e unidos podemos vencer.
O que foi a ANISTIA?
Lei da Anistia é o nome da Lei n. 6.683, que, em 28/08/79, anistiou todos os que cometeram “crimes políticos ou praticados por motivação política” no período de 2/9/61 a 15/08/79, ou seja, pessoas que cometerem crimes considerados políticos durante esse período – em especial na ditadura civil militar – não poderiam ser condenados por tais atos.
Era um cenário de relativa abertura e fim do regime autoritário e o ex-presidente João Figueiredo, com aprovação do Congresso Nacional, concedeu tal anistia. O ato incluiu os próprios militares, mas excluiu crimes de terrorismo, assalto, sequestro e atentado pessoal.
A Lei da Anistia, como ficou conhecida, permitiu o retorno de mais de 2000 pessoas que se exilaram para não serem presos. Em relação militares e torturadores do regime, a lei beneficiou todos envolvidos na repressão. Os envolvidos em casos de tortura, maus-tratos e desaparição forçada, assim como os responsáveis pela censura à imprensa, pela perseguição aos movimentos sociais entre tantos outros atos estavam livres de qualquer possibilidade de condenação.
Entre os beneficiados, encontramos o famoso coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que comandou, entre 1969 e 1973, um centro de tortura no extinto Doi-Codi (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), órgão de repressão da ditadura empresarial-militar. Mas a maioria dos torturadores eram anônimos e um dos reflexos da Lei de Anistia foi impedir que esses criminosos fossem descobertos.
Do lado dos opositores, a lei beneficiou tanto aqueles que tinham se engajado em ações armadas contra o regime quanto aqueles que apenas participaram de comícios, piquetes, greves e protestos. Nomes como Leonel Brizola, Miguel Arraes, Luís Carlos Prestes, Francisco Julião, entre outros, puderam retornar ao Brasil.
A Lei de Anistia é considerada um entrave à responsabilização dos culpados por crimes de tortura, maus-tratos, desaparição forçada e execução sumária cometidas por agentes do Estado durante a ditadura. A impunidade no Brasil é incomparável com nossos vizinhos como Argentina e Uruguai, que passaram por governos militares e tiveram leis de anistia, mas encontraram formas de reverter a impunidade e responsabilizar os envolvidos. Críticos de tal legislação consideram que essa impunidade contribui para perpetuar no Brasil uma cultura de insubordinação dos militares ao poder civil, uma aura golpista que cerca as Forças Armadas que atuam subjetivamente como um poder paralelo ou supostos tuteladores da democracia.
Baseados nessa triste experiência, é fundamental reafirmar que não aceitamos qualquer tipo de anistia ou conciliação com os criminosos do bolsonarismo.
Nenhuma anistia!
Punição e prisão os golpistas e financiadores!
Confisco de todos os bens dos golpistas e financiadores!