Aos poucos Lula está construindo a governabilidade, com o apoio da grande burguesia e do movimento social (com cargos para o MST e sindicalistas). Até mesmo o “véio da Havan” maneirou no discurso.
Um setor do agronegócio ainda resiste, mas com a ampliação das relações internacionais e da agenda ambiental (que ampliam o mercado de grãos), o jogo deve virar.
É cedo para os trabalhadores cobrarem direitos do governo Lula?
O governo Bolsonaro foi tão ruim que “qualquer coisa” que se faça é melhor. Mas, como esquerda, “qualquer coisa” é suficiente? Ou buscamos o necessário para uma vida decente?
A fome, o desemprego, pessoas em situação de rua, a morte dos Yanomamis e o desmatamento, etc. não podem esperar. Queremos uma vida digna agora! É o mínimo para uma classe que produz toda a riqueza do país.
Se os ricos, banqueiros e especuladores continuam ganhando tudo, porque os trabalhadores devem esperar que os direitos venham a conta-gotas? Não vimos o governo pedir para banqueiros zerarem os juros, as empresas diminuírem a jornada de trabalho e aumentarem os salários, revogar as reformas previdenciária e trabalhistas, etc.
E sem falar que a crise é criada pelos ricos. Eles que paguem!
Avançando igual andar de bicho preguiça
O bicho-preguiça é o animal mais lento da natureza e tem sido assim os primeiros meses do governo Lula. As promessas de campanha vão se perdendo, às vezes esquecidas mesmo e outras bem aquém do prometido. Tudo muito lento.
A ideia de ir “avançando lento e gradualmente” por dentro do sistema não tem a menor chance de avançar para conquistas para a classe trabalhadora. Na verdade, o “lento e gradual” é deixar as coisas como estão.
Eis os “avanços” no governo Lula:
Salário mínimo: Lula e até alguns ativistas comemoram o aumento de 18 reais no salário-mínimo (R$ 1320,00 e só em maio), suficiente para comprar apenas 1,6 cesta básica. E o aluguel, o lazer, o vestuário, etc.?
E não podemos esquecer da reivindicação histórica de o salário-mínimo ser o calculado pelo DIEESE, hoje em R$ 6.641,58.
A Tabela do imposto de renda é uma demonstração de como a carga tributária no Brasil recai sobre os mais pobres. Congelada desde 2015, hoje, quem ganha acima de R$ 1.908 já paga o imposto.
Outra injustiça é os maiores salários (juízes, procuradores, promotores, executivo) pagarem 27,5%, o mesmo que muitas categorias de trabalhadores. Antes essa turma paga 35%.
A proposta de Lula valerá a partir de 2024 e isentará quem ganha até R$ 2640,00. É um reajuste de 38,66%, bem longe dos 148% necessários para recompor os valores de 1996 (último reajuste integral), ou seja, que quem ganha até R$ 4.683,95 não pagaria o imposto.
Petrobrás e política de preços dos combustíveis
O caso da Petrobrás e da política de preços segue a mesma lógica. A interrupção das privatizações foi uma conquista da luta e pressão dos petroleiros, mas não houve nenhuma mudança na política de preços dos combustíveis, uma das principais promessas na campanha eleitoral. Para Lula “Bolsonaro não teve coragem de mudar a política de preço do combustível” (folha de SP). Lula também não mudou.
Na campanha eleitoral, Bolsonaro e Paulo Guedes retiram os impostos federais e reduziram o ICMS (que é estadual), protegendo os acionistas milionários e repassando os custos para o cofre público, um valor estimado em R$ 130 bilhões. Medidas criticadas pelo PT, pela FUP, a federação dos petroleiros ligados à CUT.
De fato o preço caiu nos postos, mas foi pela redução do preço do petróleo no mercado internacional: em 2022 a média foi de U$ 101 dólares o barril e em 2023 a tendência é cair para 83 dólares. Uma situação que dá fôlego para o governo Lula. Mas, como se expressou a FUP, “Isso quer dizer que, caso o preço do barril de petróleo ou a cotação do dólar subam, é possível que os preços nos postos sejam reajustados antes mesmo do repasse da desoneração”.
No fechamento dessa edição, Lula decidiu retomar os impostos federais. Resultado: aumenta o preço dos combustíveis e segue a mesma política de preços dos combustíveis. Também foi anunciado o lucro de R$ 180 bilhões, maior parte será distribuída aos acionistas. E quem paga é o povo.
Discursa contra o mercado, mas não o combate
Lula andou atacando o mercado de ganancioso, mas sem medida concreta contra esse “deus” , um poder “invisível” e responsável pela desigualdade social, pelo enriquecimento de uns e pobreza de muitos.
Para a burguesia e sua mídia, o mercado é uma entidade misteriosa e até parece ter sentimentos humanos e, por isso, precisamos agradá-lo, nos sentir intimidados e ter cuidado com ele, pois nossas vidas dependem dele. Pedem que nos sacrifiquemos para ele se acalmar e não nos fazer mal, ou seja, tudo gira em torno do mercado.
O mercado controla a dívida pública -quase 50% do orçamento-, domina as políticas fiscais e defende o teto dos gastos públicos e a privatização, entre outras. Por isso, ele deve ser combatido e não só criticado.
Lula não é contra o mercado, se ilude que pode ter algum controle. A dívida pública deixou de ser paga? As privatizações foram canceladas?
Criticar os juros altos não teve efeito prático. Foi mais para pressionar o presidente do Banco Central, um bolsonarista. Também não é nada revolucionário, vários economistas liberais, como Lara Resende, criticam combate à inflação pelo aumento da taxa de juros.